A disparidade no tratamento dado pelo mercado financeiro e pela grande mídia ao governo do presidente Lula (PT), em comparação com líderes mais ligados à direita, tem sido um tema frequentemente discutido. De forma um pouco mais cautelosa, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, compartilhou suas reflexões sobre o assunto.
Durante sua participação no CEO Conference 2025, promovido pelo BTG Pactual, na terça-feira (25), Haddad observou que o mercado financeiro demonstra estar “muito mais tenso” do que em períodos anteriores. Essa declaração veio após questionamentos sobre o tumulto que ocorreu no final do ano passado, o qual resultou em um aumento acentuado do dólar.
“Há uma expectativa maior por parte das pessoas, que estão prontas para agir com base em qualquer notícia, seja para se proteger ou para especular”, comentou Haddad.
Entretanto, o ministro acredita que “as coisas estão se estabilizando”, embora tenha reconhecido que o Brasil enfrentou um “aumento significativo” nas incertezas em dezembro, época em que o dólar disparou e houve uma fuga de capitais.
Em 2024, o real foi a moeda que mais perdeu valor em relação ao dólar, resultado de vários fatores, incluindo a desconfiança do mercado em relação ao pacote de austeridade apresentado pelo governo. Em dezembro do ano passado, a moeda norte-americana chegou a atingir R$ 6,30.
Atualmente, Haddad percebe um cenário mais nivelado em comparação a outras nações com economias semelhantes. “Alguma variação no câmbio, devido ao déficit nas transações correntes, era inevitável”, acentuou.
### Negacionismo do mercado
O ministro também criticou o que considera como “negacionismo” a respeito do déficit primário nas contas públicas brasileiras entre 2015 e 2022. Ele destacou que o saldo negativo durante esse período foi de R$ 2,1 trilhões, abrangendo os mandatos de Dilma Rousseff (PT), Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL).
“Negar a realidade e criar uma narrativa positiva sobre o passado não trará benefícios ao país. Apenas examinando as contas, podemos entender a gravidade da situação. Entre 2015 e 2022, houve um déficit primário de R$ 2 trilhões. Excluindo o impacto da pandemia, o déficit cai para R$ 1,5 trilhão. Se nos deixarmos levar por uma visão distorcida do que vivemos, não conseguiremos avançar”, afirmou.
No ano de 2022, o Brasil obteve um superávit primário de R$ 54,1 bilhões. Haddad atribuiu esse resultado favorable ao “calote” nos precatórios e ao envio de recursos para governadores. Ele defendeu que o déficit primário foi ainda maior em 2023, pois o governo Lula 3 precisou honrar pagamentos.
### Economia norte-americana
A partir da ascensão de Donald Trump à presidência dos EUA, em 20 de janeiro, a moeda americana passou a apresentar uma tendência de queda, o que indica que a responsabilidade sobre a situação fiscal do Brasil não pode ser atribuída exclusivamente a isso. Na data de ontem (24), o dólar comercial teve uma alta de 0,43%, encerrando o dia a R$ 5,755.
Durante o evento do BTG, Haddad abordou as incertezas que a economia global impõe aos mercados internacionais. “O cenário externo apresenta desafios ainda maiores”, destacou o ministro da Fazenda.
Por outro lado, Haddad salientou que agências de classificação de risco, o FMI e fundos de investimento têm uma percepção diferente do mercado local. “Essas entidades não possuem a influência que os investidores nacionais têm. Por isso, elas tendem a ser mais cautelosas antes de tomarem decisões de investimento”, analisou.
O ministro aproveitou para enfatizar a importância do reconhecimento das reformas estruturais que sua equipe econômica implementou desde 2022, visando melhorar o ambiente de negócios, independentemente das preferências políticas. “Se formos negacionistas em relação ao que vivemos, não conseguiremos progredir.”
Uma das reformas destacadas foi a aprovação da reforma tributária do consumo, uma discussão que perdurou por mais de trinta anos e que finalmente foi concretizada no governo Lula 3.
### Congresso
Embora Haddad tenha reconhecido o respaldo do Congresso para que o governo pudesse corrigir distorções e aumentar a receita, ele também reiterou que o Parlamento impede que o governo elimine o déficit fiscal.
“Dividiram a reoneração da folha de pagamentos. Fracionaram o Perse [programa de apoio ao setor de eventos]. Transformaram tudo em parcelas, e eu não consegui alcançar o superávit estrutural que seria possível sem manipulações contábeis”, ressaltou.