Por Everton Lopes Batista
(Folhapress) – O aumento das atividades de passeios de barco em torno do arquipélago de Fernando de Noronha, impulsionado pela maior circulação de turistas na área, tem causado perturbações nos golfinhos-rotadores que habitam o local. Essa situação está levando os animais a alterarem seus comportamentos, tornando-se mais suscetíveis a predadores.
Essas constatações são resultado do trabalho do Projeto Golfinho Rotador, que tem se dedicado à conservação da espécie na região desde 1990.
Os golfinhos-rotadores são famosos pela habilidade de girar em torno do próprio eixo enquanto saltam na água. Podem medir até 2,4 metros e pesar quase 80 quilos.
Em Fernando de Noronha, esses golfinhos possuem uma rotina bem estruturada, utilizando diferentes áreas do arquipélago para repousar, reproduzir-se, cuidar de suas crias e se proteger de tubarões, conforme relata José Martins da Silva Júnior, oceanógrafo e coordenador do Projeto Golfinho Rotador, cuja iniciativa conta com apoio da Petrobras.

Golfinhos rotadores podem ter até 2,4 metros de comprimento e chegam a pesar quase 80 quilos
“Antes, esses animais permaneciam na baía dos Golfinhos por períodos mais prolongados. Até 2002, a média era de oito horas diárias. Em 2004, esse tempo reduziu para quatro horas, e atualmente eles ficam, em média, cerca de duas horas e meia”, explica Silva Júnior.
Essas mudanças refletem, em parte, o aumento no número de embarcações na região. O oceanógrafo aponta que, até 2003, cerca de cinco barcos visitavam a baía diariamente. Em 2017, esse número cresceu para 16 e, atualmente, já são mais de 20 embarcações por dia.
Pesquisadores: golfinhos estão mais ‘alertas’
Membros da pesquisa notaram que os golfinhos machos que se aproximam dos barcos adotam uma postura de vigilância, mostrando-se atentos a possíveis ameaças. Quanto mais energia eles gastam nesse estado de alerta e menos tempo têm para descansar, mais vulneráveis ficam a ataques de predadores.
Silva Júnior observa que, até o momento, não foi identificada uma diminuição na população dos golfinhos da região.
Dados coletados pelo projeto indicam que, em 298 dias de monitoramento realizados nos anos de 2021 e 2022, aproximadamente 88% das interações observadas envolveram embarcações que cruzaram a área onde estavam os golfinhos.
A portaria 117 do Ibama, datada de 26 de dezembro de 1996, proíbe que embarcações ingressem intencionalmente na área onde se encontram grupos de cetáceos, incluindo golfinhos e baleias.
A penalização para essa violação pode variar de dois a cinco anos de reclusão, de acordo com a lei 7.643 de 18 de dezembro de 1987, que instituiu a proibição da pesca e do assédio intencional de toda e qualquer espécie de cetáceo nas águas brasileiras.
A portaria do Ibama também proíbe práticas como mergulho próximo aos animais, tentativas de alteração de rota e produção de ruído excessivo, todas sujeitas às penalidades daquela legislação.

Aumento de embarcações na Baía dos Golfinhos alterou comportamento dos animais
De acordo com Silva Júnior, o crescimento do turismo em Noronha não é o único aspecto que está influenciando os hábitos dos golfinhos na região: as mudanças climáticas também têm afetado a distribuição de alimentos nos oceanos, enquanto a população de tubarões-tigre, predadores naturais, tem aumentado.
No entanto, o comportamento e a quantidade de turistas são variáveis que podem ser controladas de forma mais eficiente para garantir o bem-estar dos animais.
Nos últimos dez anos, o número anual de visitantes em Fernando de Noronha subiu de um pouco mais de 85 mil, em 2015, para o recorde de 131.503 em 2024, conforme informações do Núcleo de Gestão Integrada do ICMBio.
O limite de visitantes, estabelecido pelo ICMBio em colaboração com o Supremo Tribunal Federal e o Governo de Pernambuco, é de 132 mil por ano.
Arquipélago tem limite de visitantes por ano
Fernando de Noronha é um distrito estadual sob a administração de Pernambuco, situado a 545 km de Recife. A proteção ambiental do arquipélago é responsabilidade do ICMBio, um órgão federal vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima.
Segundo o instituto, são realizadas rondas e operações de fiscalização nas embarcações que realizam passeios turísticos.
Atualmente, os operadores de passeios de barco não precisam de um cadastro formal, mas o ICMBio informa que novas normativas para a atividade turística na região estão sendo elaboradas, e o cadastramento e as permissões devem ser implementados ainda este ano.
No momento, também se discute a revisão do Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental de Fernando de Noronha, que deve incluir regulamentações sobre o turismo náutico.
“Há uma grande pressão para aumentar tanto o número de embarcações quanto as atividades turísticas na ilha. Contudo, é essencial que esses números não cresçam indefinidamente, especialmente em uma área pequena como Noronha. O ICMBio, juntamente com a administração da ilha, está empenhado em controlar essa situação e a regulamentar melhor as atividades”, afirma o instituto em comunicado oficial.