A Justiça Federal determinou que o Exército implemente cotas raciais e sociais nos processos seletivos para a admissão de estudantes em colégios militares em todo o território nacional.
A decisão foi tomada com base em uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF) contra a instituição militar, que se baseava na alegação de que a interpretação restritiva da legislação estava sendo utilizada para negar a reserva de vagas a candidatos autodeclarados negros, indígenas e pessoas com deficiência.
Conforme a decisão judicial, as vagas devem respeitar a distribuição proposta pelo MPF, fundamentada nos percentuais já estabelecidos nas normas atuais. Pelo menos 5% das vagas nos colégios militares devem ser destinadas a pessoas com deficiência, outros 5% a quilombolas, e 50% a estudantes que tenham concluído o ensino fundamental em escolas públicas. Esse último grupo também será contemplado pelas cotas raciais e sociais, com no mínimo 77% das vagas reservadas para pretos, pardos e indígenas. A concorrência geral será restrita aos 40% das vagas remanescentes.
Os candidatos que escolherem concorrer às vagas designadas a pretos, pardos e indígenas terão que apresentar uma autodeclaração étnico-racial. Caso sejam aprovados nas provas e convocados, também precisarão passar por um processo de heteroidentificação complementar para validar as informações fornecidas na inscrição.
Essa etapa, conforme a formulação do MPF que foi aceita pela Justiça Federal, ficará a cargo de uma comissão que será criada antes da publicação do edital do processo seletivo. Essa comissão será composta por integrantes dos colégios militares, representantes das secretarias de educação estaduais e municipais, além de membros da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).
Colégios militares sem implantação de cotas
Até o momento, as seleções nos colégios militares contemplavam apenas vagas para ampla concorrência. Segundo o MPF, a decisão do Exército de não adotar essas regras foi baseada em uma interpretação literal e inadequada da Lei 12.711/2012, que estabelece o sistema de reserva de vagas na educação federal. Para as Forças Armadas, a norma não se aplicaria aos colégios militares, pois menciona somente instituições de ensino superior e técnico de médio nível.
A posição apresentada pelo MPF argumenta que essa medida contraria a Constituição, assim como diversas leis e decretos que estabelecem a obrigatoriedade das cotas.
A sentença judicial reconheceu a validade dos argumentos dos procuradores da República que estão envolvidos no caso. Como os colégios militares são financiados com recursos da União, estão sujeitos aos princípios que norteiam as políticas de combate às desigualdades raciais e sociais.
A Justiça Federal enfatizou que a legislação, a jurisprudência e as diretrizes constitucionais sobre o assunto são claras quanto à necessidade de implantação de cotas em todo o sistema de educação vinculado à União. A aplicação dessas regras, segundo a decisão judicial, não depende da classificação das instituições.
“Ainda que os colégios militares sejam considerados entidades distintas e que possuam origens orçamentárias diferentes das instituições de ensino que fazem parte da rede federal, não existem normas que se sobreponham aos princípios constitucionais e à necessidade de promoção da igualdade material”, destacou a sentença da 10ª Vara Cível Federal de São Paulo.
“Se a finalidade dos colégios militares é a preparação para futuras carreiras militares, a reserva de vagas para grupos minoritários representa uma excelente oportunidade para corrigir a sub-representatividade desses grupos em diversas áreas do poder, historicamente dominadas por elites. Dessa maneira, promove-se uma transformação necessária, que o curso de um Estado conservador e elitista não consegue efetuar”, concluiu o texto.
A reportagem entrou em contato com o Centro de Comunicação Social do Exército para obter uma posição da instituição sobre a decisão judicial, mas não recebeu retorno até a finalização deste texto. O espaço permanece disponível para manifestação.